A ponte que tem uma cidade
legenda: Construída na divisa dos municípios de Avaré e Itaí, foi inaugurada em 1962 e leva o nome do governador da época.
Fonte da Foto: Arquivo Gesiel JrPrincipal elo com o Sul paulista, a Ponte Carvalho Pinto, erguida sobre o Rio Paranapanema, em meio às águas da Represa de Jurumirim, é uma das maiores do Estado. Construída na divisa dos municípios de Avaré e Itaí, foi inaugurada em 1962 e leva o nome do governador da época.
Sua história, entretanto, começa bem antes e, por justiça, essa obra deve ser creditada ao empenho do então deputado estadual Israel Dias Novaes.
Avareense que representou a sua região na Assembleia Legislativa e na Câmara dos Deputados por vários e sucessivos mandatos, nessa condição ele sustentou, em nome de Avaré, e em face do chamado “poder constituído”, causas e pleitos registrados na história regional e muitos deles travados em clima de desencontro e mal-entendidos, de reduzida gravidade e, às vezes, pitorescos.
Dentre tais casos certamente figura o da construção dessa ponte, cenário que atualmente emoldura o potencial turístico de Avaré. O envolvimento de Israel Novaes com a causa foi tamanho que ele seria por muito tempo identificado como o “Deputado da Ponte”.
A propósito, em interessante depoimento escrito especialmente para o livro “Avaré – Sua Gente, Seus Fatos”, do saudoso cronista José Pires Carvalho, o vetusto político revela pormenores sobre as medidas prévias por ele arquitetadas para conquistar a monumental edificação que hoje delimita o seu município. O curioso relato, que vale a pena ser transcrito, transcorreu em São Paulo, entre gabinetes e palácios, em meados da década de 1950:
“Veio depois a ponte. Esta exibe currículo proveitoso. Dá-se que a alta administração estadual decidira pela contenção das águas do Rio Paranapanema, a poucos quilômetros da cidade, de molde a inundar extensa área e dar origem à Represa de Jurumirim. Lindo! Acontece que a cidade situava-se para cá e a Rodovia Raposo Tavares para lá. Assim, entre a via de comunicação do município com a capital e os grandes centros estendia-se aquele formidável mar de água doce. Advertido pelos conterrâneos, dirigi-me ao governador Jânio Quadros e lhe fui logo dizendo:
Avaré vai morrer de sede com tanta água!
Jânio, paciente, treinado, remeteu-me ao secretário Faria Lima, a quem, ressaltou, caberia a decisão técnica. O Brigadeiro não se notabilizava pela aquiescência, muito menos pronta. Mantivemos discussão demorada, aqui e ali pontuada de irritação. Faria Lima propôs-me tudo: modernas, amplas e rápidas balsas, capazes de em minutos transportar boiadas, safras, ônibus, caminhões!
Não, senhor!
Desenrolou mapas sobre a mesa:
E o asfaltamento da rodovia de São Manuel?
Também não!
Afinal, recolheu os mapas, apagou no quadro negro os embarcadouros e capitulou:
Vejo que você nada tem de cordato.
Logo eu, Brigadeiro?
Logo você!
Dali parti de volta aos Campos Elíseos, onde verifiquei que o governador sabia de tudo e parecia alegre:
Pois vocês terão a ponte e para logo. Mil e duzentos metros de vão! A mais extensa do Estado!
Comentário final típico:
Conheço numerosas cidades dotadas de ponte. Pela primeira vez uma ponte terá uma cidade, e no meu governo!
Construiu-a Carvalho Pinto, na administração seguinte”.
De fato, a ponte aprovada pelo governador Jânio Quadros seria entregue algum tempo depois por quem o sucedeu. Mas o importante a registrar é que ela só foi concretizada graças à perene vigilância e à visão futurista de Israel Novaes. E, desde então, há 45 anos, a obra – que é trecho de uma importante estrada estadual - tornou-se passagem obrigatória de motoristas e viajantes que, atravessando as rodovias do Sudoeste paulista, se dirigem ao Sul do Brasil.
Restaurada recentemente, a gigantesca construção faz parte da rota do Mercosul e hoje é até considerada atração para quem visita a nova Estância Turística. Tudo porque Jânio, que de louco só tinha aparência, soube vaticinar que ela seria a primeira – talvez a única - ponte que tem uma cidade: Avaré!
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Do livro 'Avaré em memória viva', vol. I, de
Gesiel Júnior, Editora Gril, 2010